Em seu primeiro ano, Dilma Rousseff vale-se de base parlamentar inédita para aprovar o que quis e barrar as CPIs que não quis. Econômica nas MPs como Lula e FHC não foram, favorecida por desidratação extra de adversários pelo PSD e com a "sorte" da saída de Antonio Palocci, que contribuía para tensão com aliados, Dilma entrará em 2012 vendo oposição acuada pelo fantasma da CPI da Privataria.
André Barrocal no site Carta Maior
BRASÍLIA – Com uma base de apoio parlamentar de tamanho inédito desde o fim da ditadura militar, em 1985, o governo Dilma Rousseff teve, em seu primeiro ano, uma vitoriosa relação com o Congresso. Ganhou quase todas as votações, viu sair das entranhas adversárias um partido "independente" que esvazia ainda mais a oposição, conteve o apetite inimigo por CPIs contra o governo, resistiu ao forte lobby do judiciário por aumente de salário.
Um sucesso que a presidenta deixou passar sem registros no pronunciamento de fim de ano em cadeia de rádio e TV que fez na última sexta-feira (23).
Uma coincidência delimita o caminho vencedor do governo no Congresso em 2011. Em cada uma das extremidades, encontra-se a palavra “salário”.
O primeiro grande desafio da recém-empossada presidenta foi a definição, em fevereiro, do salário mínimo de 2011, que teve reajuste pouco generoso (7%) por causa do crescimento zero de 2009 – uma regra de correção do piso tornada permanente até 2015 prevê aumento com base no crescimento econômico de dois anos antes. Dilma não cedeu a apelos de aliados por reajuste maior.
Teve a mesma postura na última votação do ano, que aprovou orçamento federal de 2012 faltando dez minutos para o início do recesso parlamentar. Não aceitou nem dar aumento real para aposentado que recebe mais de um salário mínimo, nem para juízes e trabalhadores de tribunais pelo país, que tiveram no presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cezar Peluso, um atuante "sindicalista" durante o ano.
O jogo duro de Dilma com Judiciário e aposentados tinha exatamente o objetivo de garantir que o governo conseguiria bancar em 2012 um reajuste de 14% do salário mínimo sem comprometer recursos destinados a outras áreas.
Para o governo, um piso mais robusto no ano que chega será fundamental para o país atravessar a crise econômica global sustentando uma trajetória de crescimento que levou o país ao posto de sexto maior produto interno bruto (PIB) do planeta em 2011. Mais salário deve alavancar o consumo.
As medidas que o governo chamou de anti-crise são uma boa ilustração da força e do sucesso que Dilma conquistou na relação com o Congresso. E isso fica ainda mais evidente, quando se pensa no que passaram países ricos atolados da crise.
O presidente norte-americano Barack Obama lutou – e sangrou – para aumentar o teto da dívida doméstica. Na Europa governos ditos progressistas sucumbiram e foram substituídos por tecnocratas, pacotes de austeridade fiscal foram aprovados com muito custo, plebiscitos morreram no nascedouro.
Enquanto isso, no Brasil, o governo aprovava um pacote de incentivo fiscal à indústria. Arrancava autorização para controlar a especulação com dólar no chamado “mercado de derivativos”. Renovava até 2015 mecanismo que, se existe há bem mais bem mais tempo do que a crise global, é considerado essencial agora - ajuda a pagar a dívida pública sem levantar desconfiança no “mercado” de que o país vai se “europeizar”, a chamada Desvinculação das Receitas da União.
“O Congresso teve maturidade política", disse o ministro da Fazenda, Guido Mantega, em café de fim de ano com jornalistas no último dia 22. Em pronunciamento de fim de ano levado ao ar por emissoras de rádio e TV na véspera, o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), fez questão de registrar a cooperação com o governo, ao contrário de Dilma, que não mencionou o assunto. “Trabalhamos em sintonia com o governo federal para evitar que essa turbulência freie o crescimento”, afirmou.
Palocci sai: inflexão
Entre as duas coincidências temáticas que demarcam o bem sucedido ano parlamentar do governo, uma mudança no coração do governo contribuiu para melhorar essas mesmas relações. A substituição daquele que, no início da gestão Dilma, era visto como uma espécie de primeiro-ministro todo poderoso, Antonio Palocci, ex-chefe da Casa Civil.
Alvejado por denúncia de enriquecimento ilícito, Palocci balançou por três semanas no cargo, até deixá-lo – porque “quis sair”, Dilma fez questão de dizer também em café da manhã de fim de ano com jornalistas, dia 16. Até aquele momento, Palocci era o operador de uma estratégia de “jogo duro” político do governo com o Congresso, combinada com Dilma.
Uma estratégia que previa liberação a conta-gotas de dinheiro para obras incluídas no orçamento a pedido de deputados e senadores, as emendas. Que implicava usar ao máximo todos os instrumentos internos do governo para mudar a legislação sem depender do Congresso – e, portanto, de votações que sempre custam algum tipo de negociação (e concessão) política.
Dilma recorreria o mínimo possível às medidas provisórias (MPs), para reduzir ao máximo o número de votações. Não por acaso, Dilma encerra o ano tendo assinado uma comparativamente baixa quantidade de MPs. Até esta segunda-feira (26), tinha baixado 34. O ex-presidente Lula abriu o primeiro mandato com 157 e o segundo, com 69. No último ano da gestão Fernando Henrique, o primeiro com as MPs obedecendo às regras atuais, foram assinadas 81.
Palocci também foi protagonista em uma votação complicada não pode exatamente entrar na conta das vitórias do governo, embora também não possa ser considerada uma derrota. O novo Código Florestal, para cujo debate o governo foi arrastado por sua numerosa fatia de aliados ruralistas, só será votado em definitivo no ano que vem.
Como sabe que não tem nada a ganhar, do ponto de vista da imagem pública, com a aprovação da nova lei bem no ano em que o país sediará um grande encontro planetário sobre desenvolvimento sustentável, a Rio+20, Dilma preferia sancioná-la ainda este ano e livrar-se de vez do assunto. Não poderá porque a votação enroscou na Câmara, ainda sob a articulação de Palocci, precisou de seis meses para “desenrolar” no Senado, e o resultado é que os deputados só vão voltar a mexer no projeto na volta das férias.
O mesmo acontecerá com outro projeto que o governo queria começar a votar na Câmara ainda em 2011 mas terá de se contentar em discuti-lo após o recesso. É o que estabelece novas regras para aposentadorias de funcionários públicos. O governo deve realizar concursos públicos em 2012 e gostaria de contratar os servidores já dentro das novas regras. Não conseguirá.
CPIs, não
Palocci inaugurou uma longa série de ministros que viriam a ser denunciados por desvio ético em reportagens da imprensa, numa escalada que animaria os adversários do governo Dilma a adotar a mesma postura vista com o antecessor dela, Lula.
A cada acusação nova, um pedido novo de CPI, às vezes sob um batismo genérico de “CPI da Corrupção”. Seis ministros caíram por suposta corrupção, mas nenhuma comissão parlamentar de inquérito foi instalada.
Anêmica, a oposição a Dilma não consegue aglutinar um terço dos deputados ou dos senadores para emplacar uma CPI. O ano termina com os três principais partidos anti-Dilma com 88 deputados, mais ou menos a metade do tamanho que precisariam ter para abrir uma CPI. Juntos, PSDB, DEM e PPS perderam 21 deputados desde a eleição de 2010.
No Senado, os três têm 15 parlamentares - teriam de ser ao menos 27 para abrir CPIs, algo que não conseguem nem contando com dissidentes entre partidos governistas.
Desfalcada desde as urnas em 2010, no enfrentamento com o popularíssimo Lula, a oposição sofreum um baque adicional onze meses depois, quando, em setembro, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aprovou a criação do Partido Social Democrático, o PSD do prefeito paulistano Gilberto Kassab.
A sigla nasceu como a quarta maior do Congresso, atrás apenas de PT e PMDB, que dividem o governo com Dilma e o vice dela, Michel Temer, e os tucanos.
Tucanos que terminam o ano na mira da CPI que tanto cobraram contra Dilma, uma comissão destinada a apurar se houve mesmo bandalheira em privatizações da administração Fernando Henrique, como diz o livro-denúncia A Privataria Tucana.
Com o principal adversário acuado pela expectativa de uma CPI, o governo Dilma tem tudo para começar o ano legislativo mais forte do que o vitorioso 2011.
Um sucesso que a presidenta deixou passar sem registros no pronunciamento de fim de ano em cadeia de rádio e TV que fez na última sexta-feira (23).
Uma coincidência delimita o caminho vencedor do governo no Congresso em 2011. Em cada uma das extremidades, encontra-se a palavra “salário”.
O primeiro grande desafio da recém-empossada presidenta foi a definição, em fevereiro, do salário mínimo de 2011, que teve reajuste pouco generoso (7%) por causa do crescimento zero de 2009 – uma regra de correção do piso tornada permanente até 2015 prevê aumento com base no crescimento econômico de dois anos antes. Dilma não cedeu a apelos de aliados por reajuste maior.
Teve a mesma postura na última votação do ano, que aprovou orçamento federal de 2012 faltando dez minutos para o início do recesso parlamentar. Não aceitou nem dar aumento real para aposentado que recebe mais de um salário mínimo, nem para juízes e trabalhadores de tribunais pelo país, que tiveram no presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cezar Peluso, um atuante "sindicalista" durante o ano.
O jogo duro de Dilma com Judiciário e aposentados tinha exatamente o objetivo de garantir que o governo conseguiria bancar em 2012 um reajuste de 14% do salário mínimo sem comprometer recursos destinados a outras áreas.
Para o governo, um piso mais robusto no ano que chega será fundamental para o país atravessar a crise econômica global sustentando uma trajetória de crescimento que levou o país ao posto de sexto maior produto interno bruto (PIB) do planeta em 2011. Mais salário deve alavancar o consumo.
As medidas que o governo chamou de anti-crise são uma boa ilustração da força e do sucesso que Dilma conquistou na relação com o Congresso. E isso fica ainda mais evidente, quando se pensa no que passaram países ricos atolados da crise.
O presidente norte-americano Barack Obama lutou – e sangrou – para aumentar o teto da dívida doméstica. Na Europa governos ditos progressistas sucumbiram e foram substituídos por tecnocratas, pacotes de austeridade fiscal foram aprovados com muito custo, plebiscitos morreram no nascedouro.
Enquanto isso, no Brasil, o governo aprovava um pacote de incentivo fiscal à indústria. Arrancava autorização para controlar a especulação com dólar no chamado “mercado de derivativos”. Renovava até 2015 mecanismo que, se existe há bem mais bem mais tempo do que a crise global, é considerado essencial agora - ajuda a pagar a dívida pública sem levantar desconfiança no “mercado” de que o país vai se “europeizar”, a chamada Desvinculação das Receitas da União.
“O Congresso teve maturidade política", disse o ministro da Fazenda, Guido Mantega, em café de fim de ano com jornalistas no último dia 22. Em pronunciamento de fim de ano levado ao ar por emissoras de rádio e TV na véspera, o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), fez questão de registrar a cooperação com o governo, ao contrário de Dilma, que não mencionou o assunto. “Trabalhamos em sintonia com o governo federal para evitar que essa turbulência freie o crescimento”, afirmou.
Palocci sai: inflexão
Entre as duas coincidências temáticas que demarcam o bem sucedido ano parlamentar do governo, uma mudança no coração do governo contribuiu para melhorar essas mesmas relações. A substituição daquele que, no início da gestão Dilma, era visto como uma espécie de primeiro-ministro todo poderoso, Antonio Palocci, ex-chefe da Casa Civil.
Alvejado por denúncia de enriquecimento ilícito, Palocci balançou por três semanas no cargo, até deixá-lo – porque “quis sair”, Dilma fez questão de dizer também em café da manhã de fim de ano com jornalistas, dia 16. Até aquele momento, Palocci era o operador de uma estratégia de “jogo duro” político do governo com o Congresso, combinada com Dilma.
Uma estratégia que previa liberação a conta-gotas de dinheiro para obras incluídas no orçamento a pedido de deputados e senadores, as emendas. Que implicava usar ao máximo todos os instrumentos internos do governo para mudar a legislação sem depender do Congresso – e, portanto, de votações que sempre custam algum tipo de negociação (e concessão) política.
Dilma recorreria o mínimo possível às medidas provisórias (MPs), para reduzir ao máximo o número de votações. Não por acaso, Dilma encerra o ano tendo assinado uma comparativamente baixa quantidade de MPs. Até esta segunda-feira (26), tinha baixado 34. O ex-presidente Lula abriu o primeiro mandato com 157 e o segundo, com 69. No último ano da gestão Fernando Henrique, o primeiro com as MPs obedecendo às regras atuais, foram assinadas 81.
Palocci também foi protagonista em uma votação complicada não pode exatamente entrar na conta das vitórias do governo, embora também não possa ser considerada uma derrota. O novo Código Florestal, para cujo debate o governo foi arrastado por sua numerosa fatia de aliados ruralistas, só será votado em definitivo no ano que vem.
Como sabe que não tem nada a ganhar, do ponto de vista da imagem pública, com a aprovação da nova lei bem no ano em que o país sediará um grande encontro planetário sobre desenvolvimento sustentável, a Rio+20, Dilma preferia sancioná-la ainda este ano e livrar-se de vez do assunto. Não poderá porque a votação enroscou na Câmara, ainda sob a articulação de Palocci, precisou de seis meses para “desenrolar” no Senado, e o resultado é que os deputados só vão voltar a mexer no projeto na volta das férias.
O mesmo acontecerá com outro projeto que o governo queria começar a votar na Câmara ainda em 2011 mas terá de se contentar em discuti-lo após o recesso. É o que estabelece novas regras para aposentadorias de funcionários públicos. O governo deve realizar concursos públicos em 2012 e gostaria de contratar os servidores já dentro das novas regras. Não conseguirá.
CPIs, não
Palocci inaugurou uma longa série de ministros que viriam a ser denunciados por desvio ético em reportagens da imprensa, numa escalada que animaria os adversários do governo Dilma a adotar a mesma postura vista com o antecessor dela, Lula.
A cada acusação nova, um pedido novo de CPI, às vezes sob um batismo genérico de “CPI da Corrupção”. Seis ministros caíram por suposta corrupção, mas nenhuma comissão parlamentar de inquérito foi instalada.
Anêmica, a oposição a Dilma não consegue aglutinar um terço dos deputados ou dos senadores para emplacar uma CPI. O ano termina com os três principais partidos anti-Dilma com 88 deputados, mais ou menos a metade do tamanho que precisariam ter para abrir uma CPI. Juntos, PSDB, DEM e PPS perderam 21 deputados desde a eleição de 2010.
No Senado, os três têm 15 parlamentares - teriam de ser ao menos 27 para abrir CPIs, algo que não conseguem nem contando com dissidentes entre partidos governistas.
Desfalcada desde as urnas em 2010, no enfrentamento com o popularíssimo Lula, a oposição sofreum um baque adicional onze meses depois, quando, em setembro, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aprovou a criação do Partido Social Democrático, o PSD do prefeito paulistano Gilberto Kassab.
A sigla nasceu como a quarta maior do Congresso, atrás apenas de PT e PMDB, que dividem o governo com Dilma e o vice dela, Michel Temer, e os tucanos.
Tucanos que terminam o ano na mira da CPI que tanto cobraram contra Dilma, uma comissão destinada a apurar se houve mesmo bandalheira em privatizações da administração Fernando Henrique, como diz o livro-denúncia A Privataria Tucana.
Com o principal adversário acuado pela expectativa de uma CPI, o governo Dilma tem tudo para começar o ano legislativo mais forte do que o vitorioso 2011.
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