As cidades mobilizadas e os galos

Um galo sozinho não tece uma manhã:
Ele precisa sempre de outros galos.
De um que apanhe esse grito que ele
E o lance a outro; de um outro galo
Que apanhe o grito que um galo antes
E o lance a outro; e de outros galos que com muitos outros galos se cruzem
Os fios de sol de seus gritos de galo,
Para que a manhã, desde uma teia tênue,
Se vá tecendo, entre todos os galos.

E se encorpando em tela, entre todos,
Se erguendo tenda, onde entrem todos,
Se entretendendo para todos, no toldo
(a manhã) que plana livre de armação.
A manhã, toldo de um tecido tão aéreo
Que, tecido, se eleva por si: luz balão.

Tecendo a manhã (João Cabral de Melo Neto)

Relendo João Cabral de Melo Neto, encontrei esta poesia,
Já a conhecia, mas hoje ela teve mais significância para mim. É que estamos todos em burburinho criando nossas comunidades das cidades mobilizadas. Que movimento bonito, relembrei o verdadeiro sentido de comunidade – comuna, comum, o que nos une, nos identifica.
Somos tolos, idealistas, visionários?
Somos jovens, somos velhos, velhos jovens, jovens velhos?
Acreditamos que David poderá, novamente, vencer Golias?
Acreditamos que, passo a passo, poderemos difundir pelas cidades brasileiras outras verdades que não estão estampadas nas manchetes dos jornais, nas capas das revistas, nas chamadas urgentes da TV?
Não sabemos, ainda, se lograremos êxito nestas lutas diárias de Davis populares e Golias midiáticos.
Mas o que sabemos é que somos muitos galos, contando com outros galos, lançando nossos gritos para que outros os apanhem e lancem a outros até tecermos nossa manhã.
Já fizemos no passado, poderemos fazer novamente para o futuro. Com outras ferramentas, companheiros novos e velhos companheiros mas tendo a certeza de que um galo só não tece uma manhã.
Que este novo espaço de debate e de livre expressão consiga agregar todos os cantos de todos os galos dos mais diversos cantos deste nosso Brasil.

La Pasionária Ibarrure