do site Carta Maior
Senado aprova definição de gasto em saúde e regra já prevista na Constituição para governo, mas barra destinar 10% da receita federal ao setor. Planalto, que quer fonte nova de verba à saúde, preferiu liquidar assunto em 2011. Para relator e líder do PT, sessão foi 'surreal', com 'liberais' defendendo vinculação e 'esquerda' rejeitando tributar movimentação financeira. Na Câmara, relatório taxa fortunas e arruma R$ 12 bi à saúde. Deputado malufista impede votação.
André Barrocal
BRASÍLIA – O Senado reviveu na noite desta quarta-feira (7) uma batalha que, há exatos quatro anos, decidia o futuro do investimento público em saúde. Mas com papéis trocados. Em dezembro de 2007, PT e aliados votavam pela CPMF, para dar R$ 40 bilhões à saúde, e perdiam para inimigos de PSDB e DEM. Agora, os algozes do tributo queriam obrigar o adversário a gastar R$ 35 bilhões a mais em saúde, separando 10% da arrecadação só para isso. Esbarraram num governo que luta para se livrar de vinculações orçamentárias e que insiste ser necessário criar fonte nova de verba para a saúde.
Quem repetiu o papel nas duas votações, o de derrotado, foi o Sistema Único de Saúde (SUS), a quem se poderia providenciar no mínimo R$ 12 bilhões adicionais, com a taxação de milionários, segundo relatório apresentado nesta mesma quarta-feira (7), na Câmara dos Deputados.
A decisão final do Senado sobre despesas públicas em saúde foi resultado de uma intervenção do Palácio do Planalto, depois que o líder do governo na Casa, Romero Jucá (PMDB-RR), articulara, na manhã de terça-feira (6), o adiamento da votação. Para ele, seria melhor empurrar a decisão para 2012, botando um pepino de lado para que os senadores se concentrassem em outros dois – o novo Código Florestal e o fim de vinculações orçamentárias desejado pelo governo.
Contudo, postergar a votação ainda deixaria no ar o inaceitável – para o governo - fantasma da vinculação de 10% da receita à saúde, ideia perigosa de ser decidida em ano eleitoral, como 2012. Seria melhor e mais fácil arregimentar aliados para barrar a proposta agora, em 2011.
O arrebanhamento dos senadores governistas para que votassem contra a vinculação foi comandado pela ministra-chefe da Secretaria de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, que passou parte do dia no Senado. A ministra acreditava ser possível arrancar o compromisso de ao menos 41 senadores – a maioria simples entre os 81 – e liquidar logo o assunto este ano. Acertou. Placar final: 45 a 26.
CPMF e contradições
A vitória foi facilitada por uma maioria governista no Senado mais folgada para Dilma do que o ex-presidente Lula tivera. Há quatro anos, a CPMF era aprovada por 45 senadores contra 34, mas falecera pois precisava de ao menos 49 votos – era uma mudança na Constituição, algo que não acontecia com a decisão de agora.
Entre os 34 votos “não” à CPMF em 2007, alguns ilustres anti-Lula não se reelegeram, mas outros continuam no Senado e, agora, mostraram-se amigos do SUS, a defender a vinculação de 10% das receitas para a saúde, “para acabar com aquelas cenas horrorosas que conhecemos dos corredores dos hospitais do Brasil inteiro”, nas palavras do presidente do DEM, senador José Agripino (RN). Ou por que “basta pegar no noticiário nacional para verificar que a saúde precisa mesmo de dinheiro”, segundo o líder do DEM, Demóstenes Torres (GO), outro veterano de 2007.
O confronto mais duro com os algozes da CPMF foi feito pelo relator do projeto dos 10% das receitas em saúde, Humberto Costa (PE), líder do PT, ex-ministro, mas um calouro no Senado, que não participou da batalha da CPMF. “Qual preço baixou, quando a CPMF deixou de existir? (…) Ao mesmo tempo, perdemos um mecanismo importante para evitar a sonegação, para evitar o caixa dois, para evitar a circulação, no sistema bancário, de recursos ilícitos”, afirmou.
Costa deixou ainda uma ironia no ar. Para ele, foi uma votação “surreal”, com “liberais” de DEM e PSDB a defender “vinculação” de recursos, enquanto “partidos de esquerda” manifestavam-se contra a criação de um imposto para a saúde. Referia-se a PSB, que é aliado do governo, e PSOL, de oposição. “Vamos votar pelo aumento dos recursos da saúde, isso sim é que é ser socialista”, rebateu o senador Randolphe Rodrigues (PSOL-AP), a defender 10% das receitas para a saúde.
Na votação do projeto sobre os 10% das receitas para a saúde, havia uma alternativa para aumentar o investimento no setor que a esmagadora maioria do Senado rejeitou por 65 votos a 4. Justamente a criação de um novo imposto.
O projeto que estava sendo analisado nasceu no Senado em 2007, propondo carimbar 10% da arrecadação federal à saúde. Há três meses, ao votarem o projeto, os deputados derrubaram a vinculação e propuseram uma alternativa para financiar a saúde, instituir um tributo nos moldes da da CPMF, a CSS. Pelo texto aprovado na Câmara, porém, a CSS é impossível de ser cobrada. Mas se o senado a mantivesse, deixaria uma brecha para sua existência futura.
Os senadores teriam de optar agora entre o seu texto, de 2007, ou o da Câmara. Ficaram com o da Câmara, que tem duas utilidades. Define claramente o que são gastos com saúde, impedindo que prefeitos e governadores façam malabarismos e chamem de saúde o que não é. E expressa em lei o que estava apenas na Constituição: o governo federal tem que gastar em saúde, de um ano para o outro, sempre mais, com base no crescimento do país.
Fonte nova: grandes fortunas
Segundo o relator Humberto Costa, o projeto vai garantir mais R$ 2 bilhões à saúde. Pouco para a carência de R$ 45 bilhões do SUS, nos cálculos do ministério da Saúde.
Costa propôs, e o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), aceitou, que se crie no ano que vem uma comissão para examinar todos os projetos que tratam de aumento de impostos, a fim de que se possa obter alguma solução que viabilize o reforço financeiro da saúde. “Dinheiro não nasce em árvore, o Brasil precisa discutir novas fontes”, afirmou.
É a posição da presidenta Dilma Rousseff, que em agosto e setembro, chegou a esboçar defesas públicas de novas fontes de recursos para a saúde.
Uma sugestão poderia ser a taxação de grandes fortunas. Relatório da deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) apresentado nesta quarta-feira (7) pela manhã, em uma comissão da Câmara, diz que cobrar um imposto adicional de quem tem patrimônio superior a R$ 4 milhões renderia no mínimo R$ 12 bilhões por ano, cerca de um quarto da carência do SUS.
O parecer dela refere-se a projeto apresentado este ano pelo deputado Doutor Aluizio (PV-RJ), também com o objetivo de impulsionar o caixa do SUS. Com a diferença de que, na proposta dele, milionário seria o brasileiro com mais de R$ 5,5 milhões de patrimônio.
A votação do projeto foi impedida, porém, a pedido do deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), malufista histórico com passagens pela prefeitura de São Paulo nas gestões de Paulo Maluf e de Celso Pitta, já falecido.
Quem repetiu o papel nas duas votações, o de derrotado, foi o Sistema Único de Saúde (SUS), a quem se poderia providenciar no mínimo R$ 12 bilhões adicionais, com a taxação de milionários, segundo relatório apresentado nesta mesma quarta-feira (7), na Câmara dos Deputados.
A decisão final do Senado sobre despesas públicas em saúde foi resultado de uma intervenção do Palácio do Planalto, depois que o líder do governo na Casa, Romero Jucá (PMDB-RR), articulara, na manhã de terça-feira (6), o adiamento da votação. Para ele, seria melhor empurrar a decisão para 2012, botando um pepino de lado para que os senadores se concentrassem em outros dois – o novo Código Florestal e o fim de vinculações orçamentárias desejado pelo governo.
Contudo, postergar a votação ainda deixaria no ar o inaceitável – para o governo - fantasma da vinculação de 10% da receita à saúde, ideia perigosa de ser decidida em ano eleitoral, como 2012. Seria melhor e mais fácil arregimentar aliados para barrar a proposta agora, em 2011.
O arrebanhamento dos senadores governistas para que votassem contra a vinculação foi comandado pela ministra-chefe da Secretaria de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, que passou parte do dia no Senado. A ministra acreditava ser possível arrancar o compromisso de ao menos 41 senadores – a maioria simples entre os 81 – e liquidar logo o assunto este ano. Acertou. Placar final: 45 a 26.
CPMF e contradições
A vitória foi facilitada por uma maioria governista no Senado mais folgada para Dilma do que o ex-presidente Lula tivera. Há quatro anos, a CPMF era aprovada por 45 senadores contra 34, mas falecera pois precisava de ao menos 49 votos – era uma mudança na Constituição, algo que não acontecia com a decisão de agora.
Entre os 34 votos “não” à CPMF em 2007, alguns ilustres anti-Lula não se reelegeram, mas outros continuam no Senado e, agora, mostraram-se amigos do SUS, a defender a vinculação de 10% das receitas para a saúde, “para acabar com aquelas cenas horrorosas que conhecemos dos corredores dos hospitais do Brasil inteiro”, nas palavras do presidente do DEM, senador José Agripino (RN). Ou por que “basta pegar no noticiário nacional para verificar que a saúde precisa mesmo de dinheiro”, segundo o líder do DEM, Demóstenes Torres (GO), outro veterano de 2007.
O confronto mais duro com os algozes da CPMF foi feito pelo relator do projeto dos 10% das receitas em saúde, Humberto Costa (PE), líder do PT, ex-ministro, mas um calouro no Senado, que não participou da batalha da CPMF. “Qual preço baixou, quando a CPMF deixou de existir? (…) Ao mesmo tempo, perdemos um mecanismo importante para evitar a sonegação, para evitar o caixa dois, para evitar a circulação, no sistema bancário, de recursos ilícitos”, afirmou.
Costa deixou ainda uma ironia no ar. Para ele, foi uma votação “surreal”, com “liberais” de DEM e PSDB a defender “vinculação” de recursos, enquanto “partidos de esquerda” manifestavam-se contra a criação de um imposto para a saúde. Referia-se a PSB, que é aliado do governo, e PSOL, de oposição. “Vamos votar pelo aumento dos recursos da saúde, isso sim é que é ser socialista”, rebateu o senador Randolphe Rodrigues (PSOL-AP), a defender 10% das receitas para a saúde.
Na votação do projeto sobre os 10% das receitas para a saúde, havia uma alternativa para aumentar o investimento no setor que a esmagadora maioria do Senado rejeitou por 65 votos a 4. Justamente a criação de um novo imposto.
O projeto que estava sendo analisado nasceu no Senado em 2007, propondo carimbar 10% da arrecadação federal à saúde. Há três meses, ao votarem o projeto, os deputados derrubaram a vinculação e propuseram uma alternativa para financiar a saúde, instituir um tributo nos moldes da da CPMF, a CSS. Pelo texto aprovado na Câmara, porém, a CSS é impossível de ser cobrada. Mas se o senado a mantivesse, deixaria uma brecha para sua existência futura.
Os senadores teriam de optar agora entre o seu texto, de 2007, ou o da Câmara. Ficaram com o da Câmara, que tem duas utilidades. Define claramente o que são gastos com saúde, impedindo que prefeitos e governadores façam malabarismos e chamem de saúde o que não é. E expressa em lei o que estava apenas na Constituição: o governo federal tem que gastar em saúde, de um ano para o outro, sempre mais, com base no crescimento do país.
Fonte nova: grandes fortunas
Segundo o relator Humberto Costa, o projeto vai garantir mais R$ 2 bilhões à saúde. Pouco para a carência de R$ 45 bilhões do SUS, nos cálculos do ministério da Saúde.
Costa propôs, e o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), aceitou, que se crie no ano que vem uma comissão para examinar todos os projetos que tratam de aumento de impostos, a fim de que se possa obter alguma solução que viabilize o reforço financeiro da saúde. “Dinheiro não nasce em árvore, o Brasil precisa discutir novas fontes”, afirmou.
É a posição da presidenta Dilma Rousseff, que em agosto e setembro, chegou a esboçar defesas públicas de novas fontes de recursos para a saúde.
Uma sugestão poderia ser a taxação de grandes fortunas. Relatório da deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) apresentado nesta quarta-feira (7) pela manhã, em uma comissão da Câmara, diz que cobrar um imposto adicional de quem tem patrimônio superior a R$ 4 milhões renderia no mínimo R$ 12 bilhões por ano, cerca de um quarto da carência do SUS.
O parecer dela refere-se a projeto apresentado este ano pelo deputado Doutor Aluizio (PV-RJ), também com o objetivo de impulsionar o caixa do SUS. Com a diferença de que, na proposta dele, milionário seria o brasileiro com mais de R$ 5,5 milhões de patrimônio.
A votação do projeto foi impedida, porém, a pedido do deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), malufista histórico com passagens pela prefeitura de São Paulo nas gestões de Paulo Maluf e de Celso Pitta, já falecido.
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